sábado, janeiro 29, 2005

Da Invisibilidade

Os invisíveis. Parece um filme de ficção científica mas não é. Falo das pessoas feias que nos rodeiam. Daquelas que por um detalhe ou outro, ou por um conjunto colossal dos mesmos são retiradas inconscientemente do nosso leque de opções e se tornam para nós invisíveis no dia-a-dia. Não vou explicitar os detalhes que podem levar à exclusão acima. São muitos, e variam, mas não demasiado. Há um padrão. É como um código genético social, uma patine que nos aplicamos com determinada frequência fixa, como sinais de reconhecimento que extinguem as dúvidas entre os eleitos, fios que demarcam a exclusão e a inclusão, on e off.
Que pensam os invisíveis, que sentem, o que esperam enquanto caminham entre nós, tropeçando, falando mal e de uma forma estridente, inapropriada, mal combinadas as cores, o cachecol mal atado, o borboto dos defeitos a surgir por todos os lados, porque saiem de casa e se sujeitam a estas humilhações ? Não perceberão que o “Shrek” é um filme e não a realidade ? Porque não emigram ? Para a América onde são todos gordos e ninguém se importa e o país é demasiado grande e há espaço para todos, sobretudo para aqueles que se convertem e renascem, igualmente feios porém...
Mas a ditadura do proletariado não tinha sido extinta ? Que sabemos nós, que sentido temos desta vida para além de não sermos como eles, de todos os espelhos nos responderem e sussurrarem presente, sem esperarmos o resto da frase: “...estúpido...”.
Já alguma vez vos falei da sensualidade do meteorismo intestinal ? Se as regras fossem outras, não estaríamos todos imersos em acarbose ?
Há vinte e cinco anos, numa aula de português, pediram-me para diferenciar bonita de bela, e eu respondi que bela era algo mais. Hoje julgo saber menos destas coisas do que então, ou ter menos certezas. E tento abrir mais o olhar.

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