domingo, janeiro 16, 2005

Espanha 3 - Oleiros

Para que alguns amigos meus melhor repensem o urbanismo das suburbes em que vivem se dinheiro não possuem para aceder à invicta urbe, eu recomendo como case study o concelho de Oleiros, localizado na Galiza imediatamente “ao lado” da cidade da Coruña.

Antes de falar melhor de Oleiros, umas palavras sobre A Coruña. Sendo Vigo maior, mas muito mais recente, e Santiago apenas uma espécie de Braga (mas muito melhor... e com um poder semi-central), a problemática citadina galega sempre se concretizou em A Coruña, e estou a citar livremente. Coruña felix, de localização privilegiada: a cidade nasceu numa quase-ilha, com os seus dois núcleos, a Cidade Vella e a Pescaderia, a estarem rodeados por água pela frente e por trás. A silhueta da Coruña é quase a de uma inflorescência de terra que entra pelo bravio mar adentro em direcção a norte, com a Pescaderia no caule, e a Cidade Vella na boca da folha, a Torre de Hércules no seu acumen. Claro que se dermos uma visão maligna à coisa, hoje a cidade invadiu toda a base que a sustentava, vive muito mais “em terra” que por-água-rodeada, e praticamente toda a terra concelhia hoje é citadina: um concelho-cidade, como por ex. o Porto. Pouco espaço, construção cara e em altura, especulação, etc.
A cidade marca para poente o início da Costa da Morte; e a nascente delimita a discreta Ria da Coruña. A cara nascente desta ria é o concelho de Oleiros, ligado à Coruña por uma só ponte, O Pasaxe, nó rodoviário de difícil travessia.

Oleiros, concelho de origem rural, com pequenas aldeias de lavradores e calas de pescadores, é portanto a metade esquerda (no mapa) da larga península que separa a ria da Coruña da de Betanzos. É uma varanda privilegiada para o mar, para a ria e para a cidade da Coruña, logo ali em frente. O subúrbio ideal. Isto pensaram muitos construtores a partir dos anos sessenta, e mais recentemente ainda mais, quando o concelho corunhês começou a entupir.
Porém, de há vinte anos para cá, uma gestão autárquica independente levada por uma Asociación de Veciños tem travado dura luta para impedir a massificação de uma área de boa costa e de campo agradável. A construção em altura está duramente regulamentada, os condomínios são obrigados a ter largas áreas verdes, uma parte importante das quais cedidas para uso público. A costa tem sido razoavelmente limpa de construção clandestina, localidades como Santa Cruz e Mera apresentam passeios marítimos, amplas e renovadas zonas de lazer. A praia de Bastiagueiro está urbanizada com brilhantismo. Neste momento Oleiros-concelho tem 30000 habitantes, o que é pouco, comparado por exemplo com Matosinhos (5 vezes mais...). Mas vai crescer. A câmara confessa um planeamento para 40000, não mais, não sei muito bem como o pensaram, embora saiba que ali o PDM se cumpre de uma forma diferente de por estas bandas. Não é a cidade-jardim mas quase...

Duas coisas porém eu aponto a Oleiros, terra agradável onde vive muita gente nossa amiga, a maioria por opção própria: o grosso do que se tem construido tem sido médias ou grandes urbanizações de vivendas adossadas ou edifícios de 3-4 pisos em urbanização com zona comum sociodesportiva. O modelo repete-se com maior ou menor riqueza no pormenor, quase de quinhentos em quinhentos metros. As urbanizações são no geral agradáveis, evitando o Feísmo galego de anos atrás. Não evitam no seu todo a sensação de uma uniformidade porém avassaladora, quanto mais naão seja na filosofia, que é o epítome do ser suburbano. E, paradoxalmente, sendo a câmara bem de esquerda, este modelo lembra, embora comunitário e não individual, os subúrbios-jardim americanos, embora possívelmente o modelo seja escandinavo, não sei...é efectivamente um subúrbio-jardim, o melhor que eu já vi, mas é. O fenómeno urbano não passa aqui. Outra coisa não se pode dizer dos problemas rodoviários... Quase toda esta gente vai trabalhar à cidade mãe, A Coruña, e tem como opção única as mesmas estradas de há 50 anos, muito melhoradas mas as mesmas, a convergir para uma ponte de 3 vias. Autocarros sim, mas não demasiados, ferry-boats não existem, metro de superfície seria muito difícil porque o terreno nem é dos mais fáceis, acidentado, sinuoso, de qualquer forma não estará pensado para já. Problemas rodoviários são bastantes, e vão crescer.

Moral da história: se eu algum dia tiver uma casa em España, será n’A Coruña, por razões muito mais que familiares, apesar dos muitos defeitos de meretriz que a cidade tem. A não poder ser, aquela baía de Mera no concelho de Oleiros estaria mesmo a pedi-las...

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1 Comments:

Blogger tripeiro said...

Este blog mostra bem como poderia ser o Reino Galaico-Duriense... ou como os laços pessoais e culturais, podem ser muito mais fortes do que os geo-políticos.
Parabéns por mais esta janela...

11:25 da tarde  

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