quinta-feira, setembro 20, 2007

Ben Vindo ao Panteão, Homem do Demo!




Aquilino Ribeiro é 3 anos mais velho do que Pessoa, 4 mais velho do que Salazar, 7 mais velho do que Almada-Negreiros. Foi ontem transladado para o Panteão Nacional, uma decisão parentemente polémica.E assim muito se discutiu um escritor que hoje em dia quase ninguém lê. Diz-se que sucede a Camilo no exultar da língua. Ora Camilo, esse é que de certeza hoje ninguém lê, portanto…
Possuem os meus pais uma 1ª edição de “Quando Os Lobos Uivam”, de senão me engano 1957 ou 58, fugada à apreensão pela PIDE. Nasce esta posse do meu avô materno ter sido, como então se dizia, “da oposição”. Ontem como hoje, na verdade somos poucos, os “da oposição”.
“Quando Os Lobos Uivam” é um dos meus livros de referência. Não houve romance português do século XX que eu lesse e relesse com tanto prazer. O granito beirão daqueles personagens entra-nos pelos braços dentro. As árvores estão ali, toda uma encosta, a arder para nossa exultação incendiária ("spoiler...").
Lembro-me de muito novo também ter lido o então obrigatório “Romance da Raposa”. Mas mais velho passei e repassei pelo autobiográfico “Cinco Reis De Gente”, onde Aquilino explica mais ou menos como ele se fez... gente. Fiquei com a impressão de que era um livro mágico.
E a escrita de Aquilino é como que mágica. Não rebenta a língua, como um Mia Couto, utiliza-a sim em toda a sua expressão e possibilidades, trabalhando TODAS as palavras que o português usa, usou ou deveria usar, o português de Carregal, Sernancelhe, ou dos outros milhares de terras e açudes em que a semente “tuga”, como agora se diz, foi germinando. Dizia Óscar Lopes que para ler Aquilino era preciso dicionário. Muitos não compreenderam que este invejoso comentário era um elogio. Complicada, arcaica, barroca, campesina, cheia de ventanias, é uma escrita como não se fez outra. Pontuada porém sem mácula.
Comparado frequentemente a Torga, só por desconhecimento pode esta comparação ser feita. Há muita mais largura, há muita mais língua no tratamento das gentes por Aquilino. Torga por outro lado foi apenas um poeta menor. Aquilino não se meteu nisso. E o magistério de Torga foi muito menos activo e “exterior” que o de Aquilino, co-fundador da Seara Nova. Bicho por bicho, antes Teixeira de Pascoaes… como diria Cesariny.
Em 1907, aos 22 anos, Aquilino foi preso depois de uma explosão no seu quarto em Lisboa ter morto dois anarquistas. Anarquista então ele também, fiel depositário portanto de material explosivo supomos que não para minhotas festas, ele próprio descreve como se safou de problemas maiores, torcendo o tribunal para uma eventual campónia ignorância como explicação do acontecido. Ficou preso mas depois lá se safou. Ser anarquista em 1907 não era fumar umas coisas... Terá tido contacto muito directo com o grupo de regicidas que assassinou D.Carlos e herdeiro. De amizade e eventual conhecimento de intenções. Mais? Por via das dúvidas, depois do regicídio exilou-se em 1908 em Paris – dizem que por “cobardia”. “Cobardia” muito portuguesa que só lhe posso agradecer: a não fugir teria sido exilado para Timor, pelo menos. Lutou também “cobardemente” de armas na mão em 1927 e 1928 contra a Ditadura Militar de Óscar Carmona, afinal outro inquilino do Panteão.
Moral da história: eu tirava era o Carmona… Óscar, entenda-se.

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