Feliz Natal para nós três, e mais três... e os restantes.
O desejo de um bom Natal é hoje em dia uma antecipação da despedida do Ano Velho, despojados que estamos em boa verdade do conteúdo real do desejo expresso.
Primeiro, sabemos de uns e de outros que o ritual natalício decorrerá mais ou menos seguindo as mesmas habituais normas de reunião familiar, aproximadamente os mesmos pratos, possivelmente um carrulo de presentes parecido. É isto o Natal, e vai correr no geral bem a toda a gente. Hoje por hoje, a grande indecisão estará em abrir os presentes na manhã do 25, ou já trocar-los a 24 de noite.
E porém, e chego assim aonde quero chegar, um número importante de pessoas hoje à noite dirigir-se-á a uma igreja para assistir à celebração da missa do Galo.
Há aprox. 2009 anos (Herodes morreu a -4 a.c., sabe-se hoje) nasceu uma criança que, pelo fogo da palavra, sua ou atribuida, operou prodígios. Ainda hoje muito do que por Ele terá sido dito e feito alimenta o nosso quotidiano, as páginas dos jornais ou rege o nosso dia-a-dia. Feriados, pensamentos, máximas, raciocínios morais, divisões e reuniões. O ano ocidental é o ano cristão sobreposto ao tradicional esquema das estações que o clima europeu temperado desenha. Em consonância com esta omnipresença, muitos não abrem mão desta possibilidade – diz-se que essa criança foi o Filho de Deus – e declaram-se “crentes não praticantes”, e isto porque à volta do acontecido de -4 a.c. até 30 d.c. construiu-se uma religião. E o que é uma religião?
Uma religião, e fiquemo-nos pelo artigo indefinido, é o contar de um acontecido, tendo habitualmente um conjunto de textos onde acontecem histórias, parábolas, e onde, pelo caminho, se explica como nasceu o mundo que nos rodeia e o Homem. A partir daqui, e existindo sempre em comum um nível divino que dialoga através de intermediários, surgem outras duas respostas a saber: porque Existe o Homem, e como se deve comportar. Como diria o Spike Lee, “ Do the Right Thing (How To)”.
Hoje em dia não têm nascido muitas religiões novas, talvez em parte porque às primeiras duas perguntas, pelo menos para este lado do Atlântico, a ciência já deu muita resposta. Quando chegamos à fase do Big Bang e antes, encolhemos os ombros. As duas perguntas seguintes essas continuam sem resposta certa. E, como explicou George Steiner, nunca como antes um século como o XX colocou tanto em dúvida a utilidade da existência da espécie humana. Claro que, podemos sempre pensar: sem o Homem tem lógica que Deus exista? O Bem e o Mal, Luz e Trevas. Esta é a eterna questão: como existe Deus se o Mal não cede presença. Mas também: consegue o Homem só por si conceber o Bem?
Há 2009 anos terá nascido um Homem que, Ele ou alguém por Ele, criou das melhores aproximações à definição perfeita do que será o Bem, a improvável linha recta, o momento único em que caminhar sobre as águas se pode. Divino? Não sei. Humano me parece, mas a qualidade das suas respostas (ou sugestões...) seria tão grande, que a criação da religião à sua volta terá sido uma inevitabilidade. O Mal que esta religião depois produziu, um pouco por toda a parte, um pouco em todos os tempos, pode ser, simplisticamente prova apenas da Humanidade de quem afinal terá morrido, e culpado não pode ser pelo que em Seu Nome foi e é feito. E será isto tudo.
Pedem-me rituais. Em quem em verdade os viva, aceito. Não eu. Querem rituais? Um destes dias até volto a ler a Bíblia, quem sabe... Como um ritual, mas dos bons...
E lá por cima há um... céu maravilhoso, sobretudo se visto de Lamas de Mouro ou de Castro Laboreiro em dias de Lua Nova, que nos explica o quão pequenos e insignificantes nós somos, nós os biliões, os duzentos à hora, e que raramente fazemos o que quer que seja que realmente valha a pena. E lá em cima percebemos que o nosso olhar maravilhado pode ser um bom começo para nos apercebermos da urgência de nos tornarmos apenas... Formidáveis! O Caminho, portanto.
Parece o fim duma estória da Mª Alberta Meneres e é, será, não me importa. Olho para trás e só isso tenho na minha vida, as pessoas Formidáveis que já conheci. E continuam a aparecer, por aqui, por ali... algumas até, serão médicos! O impossível possível! Ah, e uma família, e a minha filha. Mas noutra conversa, ok?
E Deus? Vamos pensar em Deus: pensará ele em mim? De certeza a Nebulosa do Caranguejo ou a NGC 4567 lhe dará muito mais que fazer (aquelas colisões estelares, etc.) do que as minhas indigestões e impropérios... Suponho que de vez em quando, em algum descansinho, se ria um pouco com alguns dos meus passes humorísticos para sobreviver às mínimas contrariedades que vividas são como cataclismos. E bom proveito, não me importo, podes rir-te à vontade. Li hoje num livro na Lello (compras de Natal...) que o Deus do Novo Testamento é um Deus que não ri, que não tem sentido de humor. Discordo. Não é para rir, aquela história da igreja ser construída sobre um mestre da mentira(S.Pedro, as negações, ok...)? Só um Deus para prever assim o futuro...
Tinha que acabar assim, em blasfémia e pecado (outra conversa...) mas, meus amigos, um Santo Natal e na companhia de quem se quer Bem é realmente o que eu vos desejo.
Portanto...
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