terça-feira, junho 14, 2005

Eugénio de Andrade morreu


"é o silêncio é por fim o silêncio
vai desabar"


O balanço é difícil, morreu Álvaro Cunhal, morreu Eugénio de Andrade. Lembro-me de há muitos anos um acampamento, à beira-rio, éramos muito jovens, e de uma inocência quase dolorosa. A chuva o maior dos crimes, o riso uma tempestade. Jovens como nós andavam entre pinheiros com o seu livrinho do Eugénio de Andrade na mão, como um missal. Espero sejam hoje pessoas de bem, como não - com tal guia. Eu segui outros missais e pequei ao desdenhar aquelas capinhas brancas, matéria da fé. Mas embora nem todos lessem o que ali era escrito, a verdade por ali andava.
É frase comum dizer que a sua poesia envelheceu. E? Tentai escrever assim tão alto, jovens. É costume só ir às "Mãos e os Frutos", e depois antologiar. Não importa. Como me sinto pobre hoje. Não sei para onde ir. O melhor é mesmo nunca os ter conhecido, estes poetas. Estás perante referências perenes, estatuária incandescente, nunca te faltarão. Está perto o dia onde em Portugal só rezarão os mortos. Rezar: pedir ao dia, tudo o que ele tem para te dar. E seres obrigado a erguer-te à altura de teres um dia mais, possivelmente claro, provavelmente luminoso. Estamos parados. Morreu o Álvaro Cunhal, que foi capa, o Eugénio de Andrade "acolunado" ao lado desta merda toda. Já nada nos espanta.
 Posted by Hello

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