sexta-feira, novembro 02, 2007

Do Sportinguismo

Um amigo meu, médico, tem uma filha que "anda" no ballet. Alternando com a sua esposa na entrega e recolha da filha destas lides, este meu amigo tem com frequência conversas mais ou menos de circunstância com pais e mães de crianças semelhantes à sua: também "andam" no ballet. Com alguns desses pais/mães já encetou até algum grau de amizade. Um destes dias uma destas conversas teve foros de revelação. Julgava-se este meu amigo um sportinguista fervoroso. Descobriu não o ser.

Nestas conversas, guiadas pelo acaso e o curto tempo disponível, ainda mais porque já é horário de inverno e a recolha já se faz de noite, os temas saltam de uma forma imprevisível, tendo as mais das vezes morte rápida. Assim foi os hábitos de televisão dos presentes. O meu amigo referiu a sua frequência preferencial do Cabo, e dos canais Panda, Nickelodeon e "Sporting", ou seja, via o que a filha via, forma de estar com em regime de tempos familiares apertado, mais o tempo que o seu vício de sportinguista lhe pedia, dos poucos vícios que se permitia aliás, mais ainda, com a comissão extra de se permitir um sofá cómodo e prazenteiro para a execução a preceito do "viciozinho".

"Ah, o senhor é sportinguista!" Quem assim cortava era um homem para o baixo e para o forte, fato escuro com um risco fino e colete, isto tudo a rodear uma cara de rapaz a quem tinham oferecido um rebuçado. "Eu sou sócio dos antigos do Sporting aqui no norte. As minhas duas filhas são sócias desde que nasceram. Eu e a minha esposa vamos às Assembleias Gerais votar. Estivémos na inauguração do Alvalade XXI. Eu..." O meu amigo, aturdido com tanta fidelidade e sociedade respondeu com considerações sobre a equipa, o Miguel Veloso, o João Moutinho, que este lugar, aquele sistema, jogando no prazer de simular o entendimento do que não é mais do que um jogo, portanto com tácticas, com estratégias, já lá dizia o Gabriel Alves... Mas o interlocutor não ia muito por aí, via-se pouco afoito nessas considerações, a dele era a tribo, o sportinguismo quase como entidade teórica surreal. Separados pelo aparecimento em tropel das bailarinas/crianças/filhas, juraram-se sportinguismo eterno e cada um marchou para o seu lado. O meu amigo, que nem sócio é do seu clube do coração, carregava porém um pesado sentimento de culpa, ou melhor, de "defeito"...

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