segunda-feira, outubro 03, 2005

Problema ? Nã, são apenas 70 milhões, os turcos...


Hoje, 2 de Outubro, existem ainda dúvidas sobre se amanhã começarão as negociações para a entrada da Turquia para a União Europeia.
É este um passo de gigante, e um passo que só grandes estadistas e uma União coesa e "popular" conseguiriam dar sem grandes sobressaltos. Por isto tenho eu dúvidas sobre o sucesso do dia de amanhã.
O acesso ou não da Turquia à União Europeia (UE) devia apenas decorrer dos critérios de Copenhaga explicitados para todos os outros países que antes acederam. Infelizmente não será assim. Será a mais política das decisões, e com isto não ganhará nem o povo turco nem o grosso dos europeus.
Deve ser a UE a zelar por que em todos os seus membros exista igualdade de direitos e deveres independentemente de credo, raça, etnia, partido ou sexo; independência do corpo judicial, submissão do mando militar, democracia vigente e estável, e um corpo de leis que se pareçam no seu geral às que atravessam a sociedade europeia e que matizam um estado mais ou menos social, fazendo uma gestão harmoniosa das diferenças e das desigualdades.
Se isto se verificar na Turquia, pois que seja muito bemvinda. Se não, não.
E devia ser só isto. Mas não vai ser. Outras questões dominam a decisão de amanhã. E nem todas são particularmente justas para o lado turco, levando a uma vitimização deste, que pode obscurecer o mais importante, acima enunciado.
Vejamos por ex. a questão de Chipre.
Nos anos 60, era a Grécia governada pela chamada ditadura dos coronéis, um golpe militar de direita pretendeu unir Chipre à "pátria-mãe" grega. A Turquia, então também um regime semi-militar pelo menos, respondeu ocupando parte da ilha e defendendo os cipriotas turcos, ocupando um pouco mais de territa, just in case. E até hoje. Repare-se portanto que o problema começou na parte grega da ilha e não nos turcos. Estes, para suprir o excesso de terra conquistada, chamaram colonos da Anatólia... Enquanto isto, a comunidade internacional só reconhece a parte grega da ilha. A UE inclusivé já tem Chipre como membro do clube. A parte grega portanto, assim completamente legitimada, pretende impor condições draconianas para a reunificaçãoo a uma comunidade turca isolada, e mandou o plano da ONU às malvas (foi aprovado em referendo pela comunidade turca e rejeitado pela comunidade cipriota grega). Porém foram os cipriotas gregos recompensados ao serem recebidos na UE com toda a pompa. A UE criou o precedente de receber no seu seio 2/3 de um país, sendo que o outro 1/3 só é reconhecido e tem uma relação umbilical com outro país - que é candidato à UE desde 1964. Brilhante !
Outra questão: o genocídio arménio.
Durante e após a 1ª Grande Guerra, o Império Otomano implodiu, daqui nascendo a Turquia. Na periferia leste do país, o povo arménio, usado ou ajudado pelos russos, revoltou-se contra os turcos. A coisa correu-lhes muito mal, os nºs divergem, mas pelo menos algumas centenas de milhar de arménios ficaram pelo caminho.Estamos a falar de uma história nada agradável que aconteceu há 80-90 anos. Felizmente ninguém pede à Áustria alvÍssaras pelas maldades do defunto Império Austro-Húngaro... Que a Turquia pode e deve fazer as pazes com a história, e também com um país com quem agora tem fronteira comum - a Arménia - claro que sim. Nunca antes questões assim foram decisivas para a entrada para a UE. Imaginemos que para o acesso espanhol Madrid tivesse que tornar primeiro público quem teve razão na Guerra Civil espanhola, etc., ou derrimir de uma vez o problema vasco... Por outro lado creio que a palavra "genocídio" foi utilizada pela 1ª vez/criada para a Shoah (o holocausto judaico), e repetiu-se o seu uso apropriadamente para o drama ruandês. E se calhar por aqui ficamos. A etnia arménia terá sido barbaramente expulsa de um espaço geográfico, com muitos mortos de ambos os lados, mais obviamente do lado que perdeu. Isto não é um genocídio, por pesado que seja o balanço de vidas perdidas.
A verdade é que a perspectiva da entrada da Turquia na UE daria a esta uma dimensão pluricultural única "imparável". A Turquia é dos países culturalmente mais ricos do planeta Terra. A Europa "nasceu" na Anatólia, pois por ela entrou o Homem pela 1ª vez no "continente-eleito", e parece ser o velho Anatólio (que não tem nada a ver com o Turco...) a língua mãe de todas as línguas indo-europeias ! O cerco de Viena pelo Otomano no séc. XVII hoje só pode ter como resposta muito mais que um tratado de paz.
Só que os actuais governantes europeus não estão à altura do desafio.
Para verem como aqui se usa e abusa da pluralidade de ideias leiam: http://euobserver.com/?aid=19984&rk=1

Nota à imagem em cima: Istambul, lembro, é efectivamente a maior cidade europeia, ó senhores puristas da geografia, mais populosa que Paris, Londres ou Moscovo. Tem também por m2 mais história do que todas elas juntas... Por outro lado, como sabemos não é a Europa mais do que uma península da Ásia...
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