quinta-feira, setembro 02, 2010

Intimacy 2001

Intimacy é um filme dirigido por Patrice Chéreau. Este realizador francês, se nos guiarmos pela Wikipedia, é mais conhecido por ser um polémico director/encenador de opera. Por outro lado, o filme tornou-se mais conhecido pelas cenas de sexo explícito, sobretudo no sentido de real, não simulado, bem visível…

É um filme que merece sair deste espartilho, embora ele lhe pertença e dele faça parte.

A história é esta, e – élace – soa-me oniricamente um pouco familiar… Jaz é um bartender divorciado que tem sexo todas as quartas-feiras com uma mulher de quem não sabe o nome. Eles não falam. Ela toca à porta, ele abre, ela sobe, eles têm sexo, ela vai-se embora. Vamos falar um pouco sobre isto.

Cada cena de sexo merece uma visualização e uma análise separadas, mas não temos tempo. A primeira cena de sexo abre o filme. Chéreau consegue tornar belo o que intrinsecamente não o costuma ser – um sexo “normal”, desajeitado, “nosso” . O enquadramento não é bem o habitual  – quarta-feira, das duas às quatro – mas o "reconhecer" da performance, a tal sensação de familiaridade perde-se perante um sexo rápido, angustiado, fechado por ele a dizer “desculpa” – talvez porque a coisa não lhe saiu como queria… Vemos tudo! Vemos como é e "reconhecemos" as voltas, os passos, mas a velocidade é outra. É mais rápido, embora com pequenas hesitações, pequenos pensares, e depois acontece tudo! E termina.

E porém, tendo em atenção que esta primeira cena é das primeiras fodas (“ah, portanto é aqui que vives” “já tinhas dito isso da outra vez”), há ternura, há toque, há um calor, um arder imenso. Este (2º?) encontro é já muito mais do que genitália.

Por outro lado, este sexo é curiosamente sujeito a umas convenções. O sexo cinematográfico divide-se também, para além da visibilidade (dos genitais) e da ginástica (pélvica) que é permitido ver-se, pela audição (moans and groans…), se se ouve muito, pouco, o que se ouve... aqui também a coisa vai pela via do realismo expressivo… e quem se ouve mais é ele. Ela é, em mais sentidos do que o óbvio, mais receptáculo do que protagonista. Mas tudo acontece porque ela o procura, todas as semanas. Se não, não acontecia. E nota-se que quer muito receber. Ou receber muito. Dele. Que é diferente de obter, conseguir, ganhar, ou simplesmente ter, até.

Há uma pequena cena pos-coital em que ela adormece por uns instantes. Ele levanta-se com cuidado e senta-se a olhar. Percebe-se a maravilha. Mas já antes, logo no início do filme, quando pela primeira vez ela o acaricia, e logo a cara, o mais pessoal dos tecidos, a câmara ralentiza um pouco (perfect!) para que sintamos o que ele sente, pela espinha, pelo corpo todo. O espasmo só pode ser o passo a seguir.

Mulheres e homens existem para se desentenderem, e este filme is no Hollywood comedy, como já pelas cenas de sexo se subentendia. E no entanto, a lógica do enredo – baseado em “histórias de Hanif Kureishi”, por isso é um filme bem inglês – é clássica. A determinado momento ele não compreende esta – tanta - dádiva, pois de um oferecimento se trata, mas paradoxalmente ele quer mais, e saber mais, alguma coisa para começar. Pode um homem viver sem querer mais, e sem saber?

Entretanto ele começa a investigar, ao ir atrás dela depois de cada encontro. Ficamos pelo caminho a conhecer passado dele – divorciado, pai de dois filhos, que saiu do casamento porque ele estava morto, o casamento. Porque queria mais. Do que um casamento morto. E ficamos a saber que ela tem um marido taxista, que é actriz (má, parece…) num teatro de bairro, e que dá umas (talvez más…) aulas de teatro, por ex. a Marianne Faithfull, aqui disfarçada de uma tal Betty. Ficamos todos a saber finalmente, ela chama-se Claire.

O drama está servido. Há um último (que é apenas o segundo entre eles) diálogo, talvez com as melhores falas que eu tenho ouvido nos últimos anos em filme. Há o último sexo, onde ouvimos os dois, ela bastante mais do que tínhamos ouvido até aquele momento, mas ainda a receber, a receber. No fim de tudo, e pela primeira vez, ela despede-se: "I'm going now...". E o filme acaba com ela a ir apanhar o autocarro, e ele a fechar a porta de casa. Serenos, um e o outro. Vá lá saber-se porquê.

Neste filme, que eu gostei muito de ver, não se sabe como tudo começou. Não se sabe com absoluta certeza o que vai acontecer a seguir. Ela despede-se, falando. É isso o fim, ou um princípio? O importante porém, é que aquilo tenha acontecido.