segunda-feira, abril 16, 2007

Do Carvalhido

Hoje à tarde passei por uma casa onde já vivi. De lá lembro-me que se via o mar. Era como uma casa do futuro, tinha espaços desenhados com funções que se adaptavam, cresciam, desapareciam até, era uma casa imprevisível. Também clandestina era a casa, construida ainda naquela transição entre o Portugal de antigamente e a legalidade. Ali vivi – quanto tempo? Cá por baixo, em várias fatias como uma pizza espraiava-se um Porto em transição, de bairro periférico. Casas sociais, uma escola, uma rua recta que foi antiga saída de cidade para as praias do norte. Uma igreja quase capela com templo novo logo atrás, escondido, construtivista. Prédios novos, algum que outro laivo de planeamento, o Carvalhido, que é o bairro de que falo, é um misto da Constituição e de S.Mamede de Infesta.
Quanto tempo vivi naquela casa? Nao me lembro, é estranho, mas não me lembro. Lembro-me sim que o Sol nascia à esquerda dos altos da Lapa, corria o céu a iluminar as obras da VCI, punha-se no mar.
Ainda gosto muito da casa, lá no alto, branca e azul, como fruto de árvore que só se mordeu uma vez, longamente, não correu bem, mas onde apetece voltar com a boca toda. Como fatia de bolo onde ressalta a camada de cima, mais fina. Partes há do interior da casa que quis esquecer. É a única explicação possível para não me lembrar.

E provável.
Esqueci a disposição da sala. Esqueci o quarto. Há espaços que já não me lembro da utilidade, sequer se estavam lá. A orientação nascente-poente, assim se organizava o dia, os pequenos-almoços a nascente. Lembro-me que no hall lá estava o Amadeo que diz ENTRADA. Esqueci o quarto.
Lembro-me de entrar.

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