domingo, agosto 28, 2005

Afinal...

Lembro-me de em tempo de campanha eleitoral ter colocado aqui uma imagem do Santana com o Sócrates, igualando-os no entusiasmo sentido pela minha pessoa em votar em qualquer um deles. Bom... o que eu não esperava era acontecer o descrédito do vencedor das eleições em tão pouco espaço de tempo.
Ardem eucaliptos e pinheiros um pouco por todo o lado. Quer uma quer outra árvore, mais o eucalipto, são cereal grosso para o qual o proprietário que, vivendo longe e distraído, só aparece na hora do corte. Lembro-me da quinta do meu avô em Ovar, em cujas traseiras medrava aquilo a que nós, as crianças, chamavamos "o pinhal". Era na realidade um misto de pinheiros e eucaliptos, uns poucos de hectares. Nunca foi limpo, este pinhal, também nunca ardeu. Ovar também não é propriamente uma zona muito seca, e o "pinhal" não tinha estradas ao pé, nem nunca houve interesse que ardesse. Talvez assim se explique.
No dia anterior ao meu retomar de férias, dia 15, tive um almoço de primos da minha esposa, perto de Betanzos, Coruña. Eram às dezenas, os primos, e todos bem dispostos e alegres. Foi dose, mas lá teve que ser. Um deles, Eduardo, advogado um pouco mais velho do que eu, trabalhou há uns dez anos para a CELBI, empresa da área das celuloses/papel da Figueira da Foz. A sua função, com mais uns quantos, era convencer os aldeões de todo o Portugal a deixar plantar eucalipto nas suas terras e nos termos comuns das aldeias. Aldeões cada vez menos, cada vez menos ovelhas, cabras, etc., nada como um lucro certo, partilhado com a CELBI, na forma de árvores cortadas de x em x anos. E foi assim que o norte, o centro e parte do sul português se tornaram num mar de mato desgovernado, a pedir que o queimem.
Várias casas já arderam. Reparo porém que muitas delas eram a 2ª residência de gente com raízes na aldeia mas que predominantemente ali não vivia. E armazéns no meio do monte, com animais. Não se estão a repetir incêndios paradigmáticos, enormes, como o Caldeirão e Nisa e Mação, em 2003 (enfim, o leste do Alvão, o sul da Estrela...). Este ano é o ano do eucalipto. E como ele arde bem.
Lembram-se do Vallis Longus. Valongo, cidade emergente. Atravessada sem dó nem piedade por uma auto-estrada, pretendia crescer pelas encostas, perfurando o eucaliptal que a rodeava por todos os lados. Resultado: chamas que lamberam cortinados, que entraram por janelas.
Ardeu algum pinhal também perto do Piódão (Serra do Açor). Mas Coimbra, e as zonas de orografia mexida que compõem a transição entre o Buçaco e a Lousã, onde passa o Mondego e alguns afluentes, onde em mistura livre coexistem casas, eucalipto e giestas com porte arbóreo (é assim toda a estrada de Coimbra até poucos kms antes de virar para o Piódão) e mato e mais mato esquecido, estava a pedir o incêndio que aconteceu, ameaçando toda a zona de expansão leste e sul da cidade.
Trata-se de uma calamidade nacional, é certo. Os fogos e o sorriso estúpido e permanente do Dr. António Costa a falar deles.
Talvez esta situação seja uma das que pode transformar a escolha do próximo Presidente da República numa escolha importante.
Temos que escolher um Presidente que em 2006, com o repetir dos incêndios e perante a adivinhada incúria governamental, saiba tomar as medidas adequadas.
É que, meus amigos, entre o Sócrates e o Santana, naqueles famosos debates nunca eu observei diferenças substanciais. Diferença sim só uma: o Santana tinha mais piada.
Temos um país parado, à espera de arder. O eucaliptal é apenas um exemplo.

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