domingo, dezembro 30, 2012

A Viagem de Pi, 2012

 
 
O Canadá é aquele país frio e pacífico que coroa nos mapas os Estados Unidos da América. Aquele gordo polémico - americano - que não pára de fazer documentários e cujo nome não me ocorre passou a quase inexistente fronteira só para provar que do outro lado ninguém tinha armas nem as queria ter. Canadianos interessantes? Neil Young, Leonard Cohen, Nelly Furtado... e Yann Martel, um rapaz bem intencionado que em 2001 publicou "A Vida de Pi", um sucesso de vendas para surpresa de todos. Literatura de aeroporto ou romance do ano? Nem uma coisa nem outra e também não será o tal livro que "talvez faça o leitor acreditar em Deus". Mas alguma coisa de bom terá, pois ganhou o Booker Prize de 2002. Este livro foi-me oferecido há bastantes anos e não muito bem entendido então, pois cansou-me um pouco. Este post trata sim do filme que Ang Lee fez baseado no livro e da minha releitura subsequente do livro, com sucesso diferente: é um livro que vale a pena ser lido.
 
E o filme de Ang Lee é um filme que vale a pena ser visto. Sendo que vai dividir - já está a dividir -opiniões. Ang Lee, quem é. Realizador que podemos dizer americano taiwanense-born, já fez filmes tão interessantes como "Brokeback Mountain", "Hidden Dragon, Crouching Tiger" e "Sense and Sensibility". Dirigiu ainda o primeiro "Hulk", outro critics-divider, e como cartão de visita taiwanês o - dizem interessante - "Comer Beber Homem Mulher". Só o título arrebata...
 
E de que trata o filme? Um rapaz indiano nascido na ex-India Francesa (Pondycherry) e com o curioso nome de Piscine Molitor Patel (abreviado para Pi, como o número) vê-se apanhado por um naufrágio onde com ele sobrevivem apenas uns quantos animais que iam ser vendidos para zoos na américa e que pertenciam originariamente ao zoo dos seus pais, que morrem no naufrágio. O rapaz sofre de uma espécie de religiosidade compulsiva pois considera-se hindu, cristão e muçulmano, tudo ao mesmo tempo. Disto trata o filme (e o livro já agora) bem como do difícil convívio com um tigre de bengala - com o curioso nome de Richard Parker - num bote durante meses. O oceano Pacífico fornece o maravilhoso qb para que o festival de efitos digitais que Ang Lee maneja com superior argúcia permitam a este filme transpor o livro para a tela que sucesso, aproveitando o facto de um filme, por uima questão temporal óbvia, ser obrigado a condensar aquilo que no livro, aqui e ali demora a acontecer, expondo alguma naiveté narrativa do escritor ou jogando com o facto de ser um adolescente que conta a história. Quer o livro quer o filme - que segue a linha narrativa do livro com poucas diferenças - jogam no saber antecipado que o náufrago sobrevive. Isso é importante porque coloca-nos logo a questão de qual afinal vai ser a mensagem, sendo este tipo de livros livros mensageiros, etc e tal. A mensagem chega bem para o fim, quando a dúvida se instala e somos obrigados a optar por uma das versões da história e mais não digo - é assim no livro, é assim no filme. Não, não me parece que este filme faça acreditar em Deus. Explica sim muito bem - o filme, o livro... - o porquê dessa crença ser bem vinda...
 
Ang Lee será recordado possivelmente não como um realizador na prateleira onde arrumamos os Scorceses, os Coppola e... humm... os Abel Ferrarra... deste mundo, génios e pronto. Sucede que uma percentagem elevada dos filmes que ficam não pertencem aos génios mas aos artesãos de qualidade que Hollywood chama e alimenta. De repente lembro-me de Sidney Pollack, de Michael Curtiz... A qualidade visual dos filmes de Ang Lee é notória e um regalo para os olhos. Será um defeito Ang Lee tocar temas e tipos de filmes tão diversos? O lógica do filme americano, não nos esqueçamos, foi sempre entreter. E Ang Lee consegue-o, mas mais do que isso. E neste filme também. Este filme tem alma, que interessa que não seja a alma de Ang Lee?
 
PS: o filme é tão... resistente? "resiliente"? que até sobrevive à terrível canção dos Coldplay escolhida para...