domingo, fevereiro 28, 2010

"Azimuto a minha barca..."

Azimuto a minha barca
e o porto é onde já estou.
Esta chuva que me encharca
é a que nunca pingou.

Olho pra trás desasado
das asas que nunca tive.
Não há mudança de estado
na descida do declive.

Pedro que sou, reduzo
o sapato em que me meto
a moído parafuso
e a desgosto secreto.

Desalimento a certeza,
aperto a chave ao sorriso,
lavo a loiça, ponho a mesa,
falo faceto, agonizo.



Pedro Tamen, in Retábulo de Matérias (1956-2001), ed. Gótica, 2001.