A Faca Não Corta O Fogo
Já tardava a loucura por Herberto Helder. Porque a loucura deste poeta tão recôndito anda por aí há muitos anos, para aí uns 50. O seu último livro vai esgotar, dizem que o autor proibiu 2ª edição.
Têm 50 anos ou um pouco mais os grandes primeiros poemas de HH, de O Amor em Visita e A Colher na Boca, e em 63 saía a prosa de Os Passos em Volta, estava o mito criado. Contaram-me há muitos anos a história de Ruy Belo ter visto as provas de A Colher na Boca e ter comentado com alguém que algo novo ia ali "atacar" a poesia portuguesa, e que nada seria mesmo como dantes. É este autor centrífugo e que cronicamente recusa prémios (eg. um Pessoa) contraposto ao senhor dos heterónimos como o segundo abalo sísmico da poesia portuguesa, a segunda fantástica aventura. Vou procurar dados bibliográficos e depois irei partilhar. Por agora digo que publicou HH portanto um último livro, uma "repetição" da Súmula de 2001 (uma espécie de recriação e aperto da obra toda) com o acrescento de setenta e quatro páginas de inéditos, titulados pelo nome que intitula o volume: A Faca Não Corta O Fogo.
Numa 1ª diagonal, parece-me que o saber está aqui, e falamos de um homem de 78 anos, recluso quase, viverá em Cascais, nasceu no Funchal. Talvez um sentir de urgência (há quantos anos sem inéditos!) faça desaparecer determinada respiração que por exemplo em outros escritos alguma pontuação dava, permitindo o silêncio cantante do profundo que (me) distinguia muitos poemas de HH. E um enorme peso em algumas palavras. Por isso muitos poemas de HH permitem uma extraordinária "fala". Não estes últimos opus, como se a catarse não cedesse um segundo de controlo, como se a ideia já não fosse cantar. Poesia sem compasso nem dó, superlativa nas imagens, auto-irónica porém, o tempo marcado sendo apenas os intervalos entre os poemas. Como uma voz que vai e vem, por surtos de epilepsia. É fácil dizer que HH é uma espécie de xamã, de mestre de fantásticas cerimónias. Difícil é perceber como se vive depois de escrever estas coisas. Não por acaso a antologia organizada pelo mesmo sobre poesia portuguesa, de seu nome Edoi Lelia Doura abordava em mais do que um autor o convívio com a loucura (Ângelo de Lima, António Gancho...).
Etiquetas: livros
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